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Risco Contínuo

Estrada dos bravos, blog dos livres

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Nossa Senhora da Conceição Padroeira e Rainha de Portugal e de todos os Povos de Língua Portuguesa *

José Aníbal Marinho Gomes, 08.12.13
Faz hoje 159 anos que o Papa Pio IX pela bula Innefabilis Deus definiu como dogma de fé a Imaculada Conceição.

A crença explícita na conceição imaculada da Virgem perde-se no tempo e existiu, pelo menos desde o séc. XII, espalhando-se gradualmente por toda a igreja oriental e ocidental.

Mas já antes, no séc. VIII, a Imaculada Conceição era comemorada na Igreja Oriental, no séc. IX na Irlanda, e na Inglaterra no séc. XI.

No ano 656, no X Concílio de Trento, fixou-se o dia 8 de Dezembro como festa principal da Imaculada Conceição, assim, pelo menos desde essa data na Península Ibéria há o culto da Imaculada.

Em Portugal o culto a Santa Maria nasceu nos primórdios da nacionalidade.

Ergueram-se muitos templos em Sua honra pelo país, sendo invocada de diversas formas. “ Santa Maria! Até ao fim da Idade Média, era a esta a invocação mais comum e o mais divulgado título da mãe de Deus. Para exprimir a surpresa por qualquer acontecimento inesperado, exclamava-se:-Santa Maria! Para implorar auxílio em momentos de angústia: Santa Maria, vale! Os poetas dedicavam-lhe trovas com o nome de Cantigas de Santa Maria. Os livros dos seus devotos chamavam-se Horas de Santa Maria. As Igrejas que se lhe consagravam, as festas litúrgicas em sua honra, as terras que a tomavam por Padroeira, eram todas de Santa Maria. Desde os primeiros alvores da nacionalidade, a Virgem Santíssima conquistou com esse título o coração dos portugueses: por isso ele ficou associado para sempre aos seus e nossos domínios. O velho solar lusitano orgulha-se de ser conhecido por Terra de Santa Maria…(1)

Desde o nosso primeiro Rei D. Afonso Henriques - um grande devoto de Nossa Senhora e que fez várias concessões a Santa Maria Bracarense, como tributo pela ajuda concedida na manutenção do seu território, designadamente engrandecendo a Catedral de Braga elevando-a à categoria de templo nacional, passando deste modo, Santa Maria de Braga, a ser a Padroeira do território portucalense - que todos os reis da 1.ª dinastia praticaram o seu culto, agradecendo-lhe o auxílio prestado para a manutenção da independência do novo reino.

Também na 2.ª dinastia, iniciada com D. João, Mestre de Avis, este na Batalha de Aljubarrota incitou os seus companheiros de armas em nome de Deus e da Virgem Maria.

D. Nuno Álvares Pereira, Condestável do Reino, por ser devotíssimo da Virgem Santa Maria, que respondeu às suas preces em Valverde, Atoleiros e Aljubarrota, mandou construir a Igreja de N. ª Sr. ª da Conceição de Vila Viçosa, e encomendou, para o efeito, em Inglaterra a imagem de Nossa Senhora da Conceição. E quando ingressa no Convento do Carmo em Lisboa como irmão leigo, usa apenas o nome de Frei Nuno de Santa Maria.

A São Nuno de Santa Maria se deve a renovação de uma antiga Confraria de Vila Viçosa, existente pelo menos desde 1349 e por si consagrada a Nossa Senhora da Conceição, que ainda hoje subsiste, a “Régia Confraria de Nossa Senhora da Conceição”.

Nos séculos XVI e XVII, a doutrina da Imaculada Conceição obteve maravilhoso desenvolvimento.

Universidades, Ordens religiosas, clero e comuns fiéis lançaram-se ardorosamente à defesa da piedosa crença, deixando cada vez mais sozinhos os seus opositores.

Mas foi após a Restauração de 1640, com D. João IV, que se verifica um grande impulso na devoção à Senhora da Conceição, por todo o país.

O Duque de Bragança que era muito devoto de Nossa Senhora, compôs vários hinos e motetes em honra da Santíssima Virgem, como um Magnificat a 4 vozes e um Ave Maris Stella.

No dia 8 de Dezembro de 1640, Frei João de S. Bernardino, ao pregar na capela Real de Lisboa na presença do Duque de Bragança, agora já Rei de Portugal, termina o sermão por uma solene promessa: “Seja assi, Senhora, seja assi; e eu vos prometo, em nome de todo este Reyno, que elle agradecido levante um tropheo a Vossa Immaculada Conceição, que vencendo os seculos, seja eterno monumento da Restauração de Portugal, Fiat, fiat”.

Por provisão de 25 de Março de 1646, D. João IV, “estando ora junto em Cortes os três Estados do reino», proclamou solenemente “tomar por padroeira de nossos Reinos e Senhorios a Santissima Virgem Nossa Senhora da Comseição . . . confessare deffender May de Deus foi concebida sem pecado original”. Por esta proclamação a Virgem Imaculada era constituída e declarada, por todos os poderes da Nação, Senhora e Rainha de Portugal, a verdadeira soberana do país.

Este mesmo Rei, em 1648, mandou cunhar moedas de ouro e de prata chamadas Conceição, com a seguinte legenda: no anverso Joannes IIII, D. G. Portugaliae et Algarbiae Rex, a cruz da Ordem de Cristo, e no centro as armas de Portugal. No reverso a imagem de Nossa Senhora da Conceição, sobre o globo e a meia-lua, com data de 1648, e nos lados o sol, o espelho, o horto, a casa de ouro, a fonte selada e a arca do santuário e a legenda TVTELARIS REGNI.

A 30 de Junho de 1654, o referido monarca, enviou a todas as Câmaras cópia da inscrição latina comemorativa do juramento solene feito em 25 de Março de 1646 e para que fosse mais notória a obrigação de defender “que a Virgem Senhora Nossa foi concebida sem pecado original” ordenou que aquela inscrição fosse gravada em pedra e colocada nas portas e lugares públicos das cidades e vilas do reino(2).

Também neste mesmo ano de 1654 o reitor, lentes, doutores e mestres da Universidade de Coimbra, reuniram-se e determinaram que a fórmula do juramento de todos os futuros graduados começasse pela declaração de «defender sempre e em toda a parte que a Bem-aventurada Virgem Maria, Mãe de Deus, foi concebida sem a mancha do pecado original». E até 1910 o cumprimento de tal juramento era condição para se obter qualquer grau universitário.

Por Decreto de 20 de Junho de 1696, o Príncipe Regente D. Pedro, futuro D. Pedro II, aprovou a “Confraria dos Escravos de Nossa Senhora da Conceição”, cujo objecto era o de promover e incutir nos membros uma especial devoção a Nossa Senhora da Conceição.

O rei D. João V, a 12 de Dezembro de 1717, em circular enviada à Universidade de Coimbra e a todos os prelados e colegiais do reino, recomendava-lhes que todos os anos celebrassem nas suas igrejas a festa da Imaculada Conceição, recordando o juramento de D. João IV.

O futuro rei D. João VI, por Decreto de 6 de Fevereiro de 1818, fundou a “Ordem Militar de Nossa Senhora da Conceição”, de natureza honorífica, com sede em Vila Viçosa, dando-lhe estatutos por alvará de 10 de Setembro de 1819.

Em 1935 celebrou-se a primeira grande Peregrinação Nacional a Vila Viçosa, e em 1946, no dia 25 de Março, comemorou-se o tricentenário da proclamação da Padroeira, com a consagração de Portugal à Santa Mãe de Deus.

Também o Papa João Paulo II que a 14 de Maio de 1982 visitou o Santuário de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, no discurso de saudação ao novo embaixador de Portugal junto à Santa Sé, referiu o seguinte: ”A Deus Todo-poderoso confio a sociedade portuguesa inteira, sobre todos, invocando a abundância dos favores celestes por intercessão de Nossa Senhora da Conceição, que Portugal, há 350 anos, no Santuário de Vila Viçosa e pela voz da sua máxima Autoridade civil com explicita adesão dos Representantes da Nação, escolheu servir e honrar como Padroeira e Rainha. Deus abençoe e proteja Portugal!(3)

Desde que Nossa Senhora da Conceição é Padroeira de Portugal, os nossos monarcas, nunca mais colocaram a coroa na cabeça (pois isso equivaleria a usurpar um direito que pertencente a Nossa Senhora) e apenas em ocasiões solenes, a coroa era posta sobre uma almofada, ao seu lado direito.

Como devoto de Nossa Senhora não posso deixar de terminar com um solene cântico, que diz muito a todos os Portugueses:

 

Salve, nobre Padroeira,
Do povo Teu protegido,
Entre todos escolhido,
Para povo do Senhor.

 

 Ó glória da nossa terra,
Que tens salvado mil vezes!
Enquanto houver Portugueses,
Tu serás o seu amor
! Bis

 

 És a nossa Padroeira
Não largues o Padroado
Do rebanho confiado
Ao teu poder protector.

 

 És a obra mais sublime
Que saiu das mãos de Deus.
Nem na terra nem nos céus,
Há criatura maior!

 

 Flor de suave perfume
Para toda a Lusa Gente,
Entre nós, em cada crente
Tens esmerado cultor.

 

 A Tua glória é valer-nos,
Não tens maior alegria;
Ninguém chama por Maria,
Que não alcance favor.

 

Portugal, qual outra Fénix,
À vida torne outra vez:
Não se chame português
Quem cristão de fé não for.

 

 * Este texto teve por base um estudo da minha autoria publicado 2004, intitulado "Nossa Senhora da Conceição, Padroeira de Portugal - subsídios para o estudo da sua devoção no concelho de Ponte de Lima", com edição do Instituto Limiano-Museu dos Terceiros.

(1) Santa Maria na História e na Tradição Portuguesa, Mons. Miguel de Oliveira, União Gráfica, prólogo, Lisboa, 1967.  

(2) Esta carta foi também enviada à Câmara de Ponte de Lima, na altura em que presidia ao seu Senado o Juiz de Fora Bacharel João Monteiro de Miranda, sendo os restantes membros o Vereador mais velho e Juiz pela Ordenação João Barbosa de Araújo, os Vereadores João Dantas Morim e João de Sá Barros e pelo Procurador do Concelho António Fernandes Nóbrega e António de Matos Botelho, Escrivão. A ordem régia foi cumprida e colocadas, nas cinco portas da vila, lápides com a inscrição latina atestando a fidelidade de Ponte de Lima ao dogma da Imaculada Conceição. 

Inscrição que em tradução livre se pode traduzir assim: D. JOÃO IV, EM CORTES GERAIS CONSAGROU-SE PARA SEMPRE A SI E AO SEU REINO À SAGRADA E IMACULADA CONCEIÇÃO DE MARIA SOB UM CENSO ANUAL E JUROU DEFENDER PERPECTUAMENTE  QUE A MÃE DE DEUS, POR ELE ESCOLHIDA PARA A DEFENSORA DOS SEUS ESTADOS, FORA PRESERVADA DO PECADO ORIGINAL, E PARA QUE A PIEDADE PORTUGUESA SE NÂO APAGASSE MANDOU LAVRAR NESTA PEDRA VIVA ESTA MEMÓRIA PERENDE NO ANO DE CRISTO DE 1646, SEXTO DO SEU REINADO. 1654 

Nos nossos dias ainda é visível, no seu primitivo local, a lápide existente na chamada Porta Nova e as restantes, após a demolição das muralhas da nossa vila nos séc. XVIII e XIX, foram retiradas dos locais originais e duas delas posteriormente colocadas na fachada posterior dos Paços do Concelho, uma de cada lado da porta de acesso, tendo aparecido já nos nossos dias uma outra, bastante mutilada, que se encontra no Instituto Limiano - Museu dos Terceiros.

(3) L’Osservatore Romano, n.º 8, 24-2-1996.

 

 

 

 

 

 

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